domingo, 11 de março de 2012

Papel e caneta à mão.



Estou sempre de papel e caneta à mão. Não se assuste não quero te entrevistar, vida. Não farei perguntas maliciosas, ou nem te jogarei contra a parede. Quero apenas estar preparada, estar a postos. Quero apenas anotar, cada cena, cada comentário. Quero não me esquecer das deixas, das queixas, dos canários.

Folheei algumas páginas desse meu caderno de anotações, e deixei sorrisos escaparem do canto dos lábios. Deixem lágrimas borrarem o 'o' da dor. Ah, e é claro, as anotações de rodapé, cheias de risadas sonoras, confetes jogados no ar, cabelos rodopiando, rodopiado, jogados, descabelados. Ainda sinto o perfume das rosas que descrevi, que despetalei, que quis bem-me-quer. Oh, e a aspereza dos calos não me assustam quando vejo quantas palavras ricas a experiência trouxe. O que me arremete ao som dos dedos teclando sedentos, pra falar, falar e falar  - e como esses dedos falam. Que página suja é essa? Será isso a lama em que o branco se afundou em que as mãos se entrelaçaram e fizeram arte? Essa mesma lama que sua mãe gritou que lhe fizera perder a camisa novinha, presente da tia? E por falar nisso, onde será que anotei sobre os discos velhos, apinhados de poeira, detentores de tangos tão tradicionais quanto apaixonados, que fizeram teus sapatos gastos riscarem o chão da sala? História que ouvi centenas de vezes minha mãe contar, “ainda lembro-me da minha madrinha dançando desse jeito aí ó, lá nos bailes; era a coisa mais linda.”

No chão riscamos à giz os desenhos de uma família feliz. Dos trecos e velharias, fiz brinquedos que brincaram minha infância inteira comigo, e duraram mais do que aqueles caros, comprados pelo papai Noel – ainda tenho alguns rascunhos de cartas que lhe escrevi, meu bom velhinho.

E cá está meu agradecimento eterno ao meu criado mudo, por sem dizer nada, sempre estar lá ao meu lado, dando luz à meia noite no meu quarto, quando a insônia não dava descanso aos meus olhos. Esses olhos cansados, porém atentos. Guardados atrás de lentes que me ajudam com esses 4 graus de miopia. E o que os olhos não veem, o coração sente sim. Ele vibra diante de um grito daquela torcida pouca, mas boa, que se uniu no Bonfim. Ele grita, tão ou mais alto que a música, samba-de-raiz, que sacode meus pés, às vezes antes mesmo que eu perceba. E vou sambando, se Deus quiser, até o anoitecer. Diante da lua, fiz algumas juras de amor. Que ela não tenha ouvido todas, ou quem vai pensar que sou?

Dizem que sou louca, exagerada, vazia, grossa, inspirada, criativa. E vão dizendo, dizendo, dizendo. Mas o que eles não sabem é que vou aqui escrevendo na memória, às vezes falha, cada pedaço de mim. Porque é isso que amo na “escrita”: poder ser eu em cada cantinho.

Às vezes não sei explicar por que levo à mão papel e caneta. Mas meu coração bate feliz em dizer que, na verdade, que mesmo depois de escrever tanto, ainda estou em branco.


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